O Eclipse Solar de 1919

A comprovação da Teoria da Relatividade Geral, de Albert Einstein, completa um século em maio. E foi no interior do Ceará que cientistas brasileiros e ingleses ajudaram o famoso físico alemão a provar sua tese. Esta proeza científica foi conseguida em 29 de maio de 1919, quando as fotografias de um eclipse solar, tiradas na cidade cearense de Sobral e na Ilha do Príncipe (África), foram fundamentais para comprovar a deflexão da luz pela gravidade, prevista por essa Teoria. Tal feito histórico teve grande repercussão na imprensa brasileira, europeia e dos Estados Unidos, transformando Einstein em celebridade mundial e abrindo novos horizontes para o conhecimento científico.

A Teoria

Em 1915, Albert Einstein anunciou a Teoria da Relatividade Geral, afirmando que a massa dos corpos deforma o espaço próximo a eles, de modo que o caminho da luz emitida por um astro, ao passar pela vizinhança deformada, deixa de ser uma linha reta e é desviada. Entretanto, esse feito só poderia ser testado por meio de um eclipse total do Sol, ao observar as estrelas que estivessem atrás/ao fundo dele. Para se comprovar a teoria, algumas expedições científicas partiram em busca de locais favoráveis à observação, seguindo previsões de eclipses.

As expedições para Sobral e a Ilha de Príncipe

Após a Primeira Guerra Mundial, a previsão do próximo eclipse apontava para sua ocorrência no dia 29 de maio de 1919. Estudos sinalizaram a cidade de Sobral, no Ceará, e a Ilha do Príncipe (África), como locais com condições geográficas favoráveis à observação, pois estavam na rota da sombra total causada pela ocultação do Sol pela Lua

Brasil e Reino Unido ocuparam papéis importantes na realização dos experimentos. Para acompanhar o eclipse, Sir Frank Watson Dyson, astrônomo Real Britânico e ao mesmo tempo diretor do Observatório de Greenwich, organizou duas expedições astronômicas: uma integrada por Arthur Eddington e Edwin Cottingham, partindo para a Ilha do Príncipe, e outra formada por Charles Davidson e Andrew Crommelin, rumando para Sobral, cidade indicada por Henrique Morize, então diretor do Observatório Nacional, que também enviou uma expedição própria a Sobral.

No momento do eclipse, o mau tempo prejudicou a qualidade das imagens do céu na Ilha do Príncipe, permitindo o registro de apenas seis estrelas. Em Sobral, o céu estava limpo e as placas chegaram a registrar 12 estrelas.

O dia que virou noite

Pouco antes das 9 horas da manhã daquele dia 29 de maio de 1919, a cidade de Sobral viveu um de seus mais simbólicos dias: o eclipse solar total. A Lua começou a sobrepor-se ao Sol, encobrindo-o por completo ao longo de 5 minutos. Durante o fenômeno, várias fotografias foram tiradas sucessivamente pelos astrônomos ingleses a partir de câmeras acopladas a telescópios, registrando a posição das estrelas próximas à borda solar. As estrelas, que normalmente estariam ofuscadas pelo Sol, puderam ser vistas e fotografadas. As 26 placas obtidas em Sobral com dois telescópios de tamanhos diferentes, registraram um total de 12 estrelas, das quais sete, visíveis em todas as placas, foram usadas mais tarde como referência para medir o ângulo de desvio da trajetória de seus feixes de luz. Na Ilha do Príncipe, onde o tempo ficou nublado, os ingleses só conseguiram aproveitar duas placas fotográficas. Esse efeito, chamado deflexão da luz, faria com que as estrelas observadas fossem vistas em uma posição aparentemente diferente de sua posição real, comprovando assim a teoria de Einstein.

Simultaneamente, os astrônomos brasileiros também tiraram fotografias astronômicas, utilizando os equipamentos do Observatório levados para o trabalho em campo, dois telescópios e três espectrógrafos. O objetivo de seu programa de observações era fotografar e analisar as características físico-químicas da coroa solar, observada apenas durante a fase da totalidade de um eclipse. Com o telescópio maior foi possível obter sete fotografias bastante nítidas da coroa solar. Nas fotografias com exposição mais curta, uma protuberância solar destaca-se na imagem. Além disso, os brasileiros utilizaram duas câmeras fotográficas para registrar os participantes da expedição, o acampamento, e a paisagem local.

As fotografias originais obtidas pela equipe brasileira, assim como toda a documentação gerada a respeito do planejamento e realização dessa expedição e alguns instrumentos levados a Sobral estão sob a guarda do Museu de Astronomia e Ciências Afins e do Observatório Nacional.

A comprovação da teoria

Em 6 de novembro de 1919, os astrônomos ingleses apresentaram a confirmação das ideias de Einstein na Royal Astronomical Society, em Londres, após avaliarem os dados obtidos a partir da análise das placas fotográficas feitas em Sobral e na Ilha de Príncipe. O resultado final das observações feitas na Ilha de Príncipe apresentava um desvio médio de 1,6 segundo de arco, enquanto nas de Sobral havia um desvio de 1,9 segundo de arco, quase duas vezes o valor estimado na teoria gravitacional do físico inglês Isaac Newton (1643-1727), elaborada e apresentada dois séculos e meio antes.